segunda-feira, 24 de julho de 2017

Acesso ao coração


Edson Pereira

Coração tá apertado e causando muita dor;
Dores que nele provoquei, e outras que ele provocou;
Coração tem muitas chaves e segredos;
E colocar a chave errada pode provocar um grande desespero;
E isso não ruim: é apenas o coração que é enigmático;

Coração, fonte de todos os desejos;
A vida percorre em ti em múltiplas pulsões;
E se esquivar dele é negar sua natureza;
Natureza que faz e refaz; cria e destrói;
E o coração sem isso murcha, seca: um vazio o corrói;

Entrar no coração é como entrar no labirinto de Dédalo;
Sabemos da entrada, mas desconhecemos a saída;
E tentar levantar asas para fugir;
É perder, desperdiçar, jogar fora o bem mais precioso: nossa vida...

Enfrentar o Minotauro não é uma opção: é a única saída;
E para chegar à saída tem quer enfrentar os medos;
Os medos foram narrativas míticas criadas;
Desprezar essa sabedoria é desprezar toda a busca de sentido;
Que desde o principio e até hoje no mundo inteiro, o ser humano busca: é o que temos visto;

Para enfrentar o Minotauro: tem que ir além de si mesmo
Além da morte e da vida;
Da alegria e da dor;
Da angustia e da certeza: ambas provocadas por decisões;
Que a existência que flui do coração nos impõe;

Assim me lanço como Teseu, com minha espada, arco e lança;
Para que no momento que o Minotauro eu me deparar;
Todas as pulsões da minha vida vou usar;
Para encontrar o final do labirinto;
Que é este coração de conflitos: de vida e de caos;

Que busca a forma de plenitude que um dia a essência de Deus;
Por meio de uma palavra em substantivo foi afirmada;
E amor seu nome seria;
E só ele, no coração pode tudo transpassar;
E isso é difícil, mas não impede de tentar;  

Coração é céu, inferno e purgatório;
 Na obra de Dante veja o que o amor pode causar;
Até Pascal disse que a razão dele não pode se safar;
Ele é misterioso e profundo que: a razão jamais vai encontrar;

Muita cacimba ao longo da existência;
Pra descrever o coração foi cavada;
Muita água teve gente que ao longo do tempo da cacimba tirou;
E do coração não descobriram nada:
Apenas vestígios do que sobrou da água e da terra;

Um dia, em meio a tantos devaneios;
A esposa de Eros encontrei, e sobre o assunto do coração eu perguntei;
Ela me disse: preste atenção!
Que as coisas do coração só o amor pode ultrapassar;
E isso não se explica: leia minha estória e logo saberá;

Foi aí que percebi que o coração, não tem necessidade de decifrar;
E isso, um dia se deu, numa noite gelada, quando vi teus olhos brilhar;
Nesse dia, decidi, a ti meu coração entregar...
E foi na poesia, a mais bela criação humana que para ti procurei expressar:
Que a entrada e saída do meu coração só o seu amor pode acessar.


quinta-feira, 13 de julho de 2017

Contrato Epistemológico

 
 
Edson Pereira
 
 
O contrato Epistemológico é um acordo, entre ás várias epistemologias que buscam superar os dualismos que podem ser representados em diferentes perspectivas. Isso se torna significativo com o nascimento da Ciência Moderna que estabeleceu um estatuto epistemológico, que poderíamos denominar de excludente, dogmático e repressor. Isso explica, o porquê das Humanidades serem tratadas como pseudociências. Contudo, na física, entre os ramos que ela mesma constitui, se destaca, dentre outras, sobre o que estamos discorrendo, a Mecânica Quântica. Ela aponta que, dado os movimentos diante daquilo que se apresenta: a coisa em si, (preferimos o uso do termo “coisa em si” do que o termo objeto) tanto a coisa em si, como outro sofre transformação, modificação em conhecer e absorver o real em sua totalidade, porque não dizer: a verdade em si. Implica dizer que o Estatuto Epistemológico Científico Moderno, através de seus métodos: é apenas uma gota d’agua que emerge do grande oceano, que fomentou sua origem e por isso, dele se esvai dada a sua dimensão que transita e perpassam os dualismos.
Por isso, as religiões e suas religiosidades, como elemento cultural, tem sua linguagem epistemológica que mesmo forjada dela, lhe escapa. E são várias as epistemologias que influenciaram e foram influenciadas pelo elemento religioso. A linguagem religiosa é de uma dimensão profunda e assim como a ciência tem o seu caminho, e isto não garante que seus métodos e postulados sobre a verdade, o real, com todas as suas implicações filosóficas e existenciais lhe permitam como outrora ela para si outorgou, o mesmo que a ciência moderna outorga para si (na verdade este é o problema de todas as Ciências) aquilo que podemos chamar de hegemonia epistemológica – ela formula o caminho da verdade; estabelece a partir de seus postulados os métodos delimitando apenas o seu caminho metodológico como autêntico e verdadeiro. Ironia do destino: a Ciência moderna de hoje trata a linguagem religiosa assim como a linguagem religiosa a tratou: com exclusão.
O contrato epistemológico que advogamos é despido de dualismos. É integrador, abrangente, aberto, pois busca a compreensão do todo em suas várias formas. Implica dizer, analogicamente que assim como a Ciência Moderna é uma gota d’agua deste obscuro oceano, da mesma forma estas outras Ciências, em nosso caso, a linguagem religiosa e a religiosidade com sua epistemologia e práxis é mais uma gota d’agua desse oceano. A verdade em si, não pode ser absorvida por epistemologias e metodologias. Parafraseado Nietzsche, a verdade desde que ela se tornou objeto de busca, ela provocou sedução. Tornou-se sedutora. Muitas epistemologias oriundas desta busca criaram e descreveram suas relações para a verdade e como entendiam a verdade, mas não o que é a verdade em si. Para isso, se faz necessário um contrato que integre e transite entre estas várias epistemologias absorvendo e sendo absorvida, sem, no entanto alienar-se de seus pressupostos que surgiram de seu lugar perspectivo. É uma epistemologia que nos termos Tillichiano é chamada de fronteira. Propõe uma relação com as demais epistemologias, permite dialogar e a partir do seu lugar construir uma epistemologia que reúna estas duas crianças: imanência e transcendência, ambas metaforizadas por Nietzsche e pelo Cristo. A criança de Nietzsche é poiesis que reúne em si todos os elementos da vida - imanência. A criança do Cristo é cósmica, aberta para aquilo que lhe transcende, pois esta ligada ao todo – Transcendência. A verdade hoje não pode ser buscada de forma isolada, mais em conjunto, na relação, a partir do seu lugar perspectivo, pessoal e social. Podemos dizer que esse contrato epistemológico inaugura uma nova dimensão, ou nos termos de William Blake, uma união, em que a imanência e a transcendência se tornam uma só carne.