domingo, 22 de março de 2015

História, Contexto e Memória das Igrejas Cristãs

Edson Pereira


Introdução

  A beleza da religião cristã pode ser percebida, na arte, na liturgia, literatura e em sua teologia dogmática. Contudo o que tem de mais expressivo nesta beleza é sua diversidade. Diversidade expressa ao longo da sua história, completamente contextual sem, todavia perder sua s raízes passadas, mas a partir delas elaboravam sua teologia e que hoje podem ser trazidas as nossas memórias nos identificando com suas histórias.
     Neste texto nos propomos apresentar alguns destes cristianismos marcados por sua diversidade e em razão disto considerados heréticos pela igreja oficial. Em primeiro lugar veremos quem foram estes cristãos, segundo, suas origens e em terceiro lugar sua teologia e por último destacaremos um dentre estes movimentos apontando sua importância no estudo da teologia contemporânea.

I.                   Quem foram os albigenses?

Movimento cristão com ideias anticlericais, dualistas – acreditavam na existência de um mundo espiritual bom e de um mundo material ruim. O primeiro criado pelo deus bom o segundo pelo deus mau. Eram gnósticos – consideravam a encarnação de Cristo como apenas aparente, pois era impossível o divino ter contato com a matéria que era impura e obra do deus mal. Outra característica deste movimento era o ascetismo extremado. Podemos dividi-los em dois grupos: Perfeitos e Crentes. O nome Albigenses surgiu em decorrência da cidade de Albi no sul da França lugar de muita influência do movimento, eram conhecidos também como Cátaros que significa puros.

1.      Origem do movimento

              A origem do movimento nós podemos dividir em dois momentos. O primeiro do ponto de vista histórico resultou “das mudanças culturais, sociais e econômicas dos séculos XI e XII” (FALBEL, 1976, p. 39). Em segundo, do ponto de vista religioso com a ênfase dada à formação clerical e sacramental os leigos constituídos de “cavaleiros pobres, mercadores e artesãos” (FALBEL, op. cit., p. 38) que ficaram a margem dos assuntos relacionados à igreja o que propiciou sua rápida disseminação e desenvolvimento. Abrangendo “Alemanha Ocidental, Flandres, França e Norte da Itália” (FALBEL, loc. cit.). 

2.      Teologia

            Em primeiro lugar sua teologia é fortemente marcada pelo dualismo – “perfeito e o imperfeito, o absoluto e o transitório, o eterno e o temporal, o bem e o mal, o espírito e a matéria” (FALBEL, op. cit., p. 53). Logo existiam duas divindades uma boa e outra má.  Sendo que o primeiro triunfaria no final sobre o segundo, salvando a todos. Para isso o deus bom enviou Cristo, um anjo que se dispôs a salvar a todos que estavam cativos a carne, obra do deus mal.
            O Antigo Testamento foi repudiado por constituir-se criação de Jeová – deus mal. A mensagem de Cristo tinha como referencia o Evangelho de João responsável de trazer conhecimento e libertação. Negavam a encarnação, morte e ressurreição de Cristo - gnosticismo.
            Sua eclesiologia era exclusivista apenas aos Perfeitos que recebiam o consolamentum (ritual de introdução ao catarismo) faziam parte da igreja. Para os demais neste caso o grupo dos Crentes seria necessário receber o consolamentum e assim tomar parte junto aos eleitos ou espirituais neste caso os Perfeitos. Praticavam a ascese e celibato. O pecado originava-se do céu e não existia inferno e purgatório.

II.  Quem foram os Valdenses?

            Movimento cristão de pregadores itinerantes que cultivavam a pobreza, simplicidade e a penitência como sinal de autenticidade e identidade apostólica e cristã.

1.      Origem do Movimento

             Podemos dividir em dois momentos que estão intrinsecamente relacionados. O primeiro se refere aos males trazidos da igreja oficial. O seu ideal de simplicidade e humildade fora trocado por riqueza e poder. Provocando no coração de alguns (mas) o desejo de voltar à simplicidade do Evangelho.
             É neste contexto que Pedro Valdo em mais ou menos 1173 e 1176, depois de ouvir uma canção que falava da vida abnegada de São Aleixo, solicitou ao um teólogo o que fazer para se chegar até Deus e ele prontamente citou “Se queres ser perfeito, vai, vende os teus bens, dá aos pobres, e terás um tesouro no céu. Depois vem, e segue-me.” Ao ouvir o texto bíblico pôs em prática literalmente dando inicio ao movimento (WALKER, 2006, p. 355).

2.      Teologia

             Para os valdenses até Constantino a igreja cristã era pura e pautada pelos ideais de Cristo e dos Apóstolos. Com a ascensão do Papa Silvestre a igreja perdeu sua identidade cristã e apostólica.  
             Sua doutrina pode ser dividida em duas categorias: Aqueles do “Norte dos Alpes e os da Lombardia” (FALBEL, op. cit. p. 63). O primeiro, afirmavam a proibição dos juramentos no Evangelho, o poder civil não podia exercer a pena de morte, o sacramento do altar poderia ser consagrado pelo leigo e por último negavam que a Igreja Romana pudesse ser a Igreja de Cristo.
             O segundo grupo proibia a consagração dos sacramentos por meio daqueles que havia cometido pecado mortal, associavam a igreja romana como a mulher prostituta representada no apocalipse e em decorrência disso a doutrina católica e seus dias de jejuns não deviam ser obedecidos.
             Sua eclesiologia era hierárquica formada por Bispos, Presbíteros e Diáconos. O bispo era responsável pela administração dos sacramentos da penitência, da ordem e da eucaristia e delegava aos presbíteros o direito de pregar o Evangelho e das confissões auriculares. Ao bispo cabia absolvição dos pecados confessados.
             Aos presbíteros cabiam funções como: ouvir as confissões sem, contudo poder absolver os pecados, no caso da morte de um bispo poderiam eleger ou ordenar um bispo. Os diáconos eram responsáveis de auxiliar o bispo e os presbíteros em suas carências materiais. Era-lhes restringindo ouvir confissões.

III.             Quem foi Joaquim de Fiore?

                 Abade Cisterciense da Calábria, asceta respeitado, dedicado a igreja e fundador da congregação cisterciense reformada.  
  
1.    Teologia
                 No centro de sua teologia esta a Trindade. Para Joaquim a Trindade se manifestou em três épocas distintas na história da salvação. Com quarenta e duas gerações de trinta anos cada uma. A primeira é denominada a Idade do Pai que esta relacionada à letra da lei do Antigo Testamento, momento dos desposados e leigos. Segunda, Idade do Filho é uma transição do espírito e da carne ou momento dos clérigos. A última é a Idade do Espírito Santo, dos monges com inicio em 1260, com a pregação do Evangelho Eterno, trazendo uma interpretação espiritual que seria transmitida através de uma ordem monástica nova, transformando a igreja carnal em uma igreja perfeita.

IV.              Os valdenses e sua importância para teologia contemporânea
                 Em primeiro lugar devemos destacar a teologia Valdense importante para nosso contexto principalmente Latino Americano que no seio de suas igrejas e lideranças são caracterizados por poder e riquezas desnecessárias. São igrejas que se preocupam mais com o seu status monetário e político do que com mensagem simples e igualitária do Evangelho.
                  O ideal de pobreza e simplicidade do Evangelho são trocados por pompas e mensagens triunfalistas apresentando Deus como a favor de uma classe rica e saudável e em oposição aqueles (as) que não atingem este ideal e logo são considerados amaldiçoados (as) por Deus ou absurdamente denominados (as) de sem fé.  
                 Outro destaque é a mensagem de arrependimento que os Valdenses inspirados em Cristo e nos Apóstolos proclamavam. As nossas igrejas se preocupam mais em atender as demandas mercadológicas de esteira capitalista do que glorificar a Deus. Por isso as pessoas são vistas apenas como clientes, possibilidades de negócios, apresentando Deus apenas como um produto ou um mágico que fará tudo aquilo que seus desejos egoístas quiserem. Com isso queremos dizer que as mensagens de nossas igrejas são antropocêntricas, o homem e não Deus é centro destas mensagens. Por isso em primeiro lugar devemos pregar a mensagem de arrependimento, pois ela é prelúdio do Reino de Deus.

Considerações finais
             Conhecer estes movimentos, suas origens e seus pensamentos nos situam ao momento histórico, contextual e memorial. Histórico porque a “distância histórica, ao proporcionar um foco situado além do que tomamos como certo, pode ser um componente surpreendente da compreensão contemporânea” (LINDBERG, 2001, p. 14). Contextual porque estes movimentos surgiram a partir da sua vivência que proporcionaram a eles formular uma teologia que atendesse a suas necessidades e utopias de um povo sofrido e marginalizado muitas vezes pela própria religião. Memorial porque nossa “memória é o fio condutor de nossa identidade pessoal” (LINDBERG, loc. cit.).

Referencias Bibliográficas:
1.FALBEL, Nachman. Heresias Medievais. 1. ed.  São Paulo: Perspectiva, 1976.
2.LINDBERG, Carter. Reformas na Europa. Trad. Luís Henrique Dreher e Luís Marcos Sander. São Leopoldo: Sinodal, 2001. 
3.WALKER, Wiliston. História da Igreja Cristã. Trad. Paulo D. Siepierski. 3. Ed. São Paulo: ASTE, 2006.

 

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